Os livros da vida de Pedro Mexia, Tati Bernardi e mais
Por: Beatriz Sertório a 2024-12-10
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É uma curiosidade natural de qualquer leitor: o que lêem os escritores que admiramos? A resposta pode estar num novo livro, recém-chegado às livrarias. O que lêem os escritores? parte de um desafio colocado a vários autores do catálogo da editora Tinta da China para escreverem um texto original sobre um ou mais livros que os marcaram — aquele a que voltam várias vezes, aquele que os fez descobrir a leitura, aquele que os acompanhou numa viagem ou que simplesmente nunca lhes saiu da cabeça … O resultado é uma verdadeira ode à leitura e às histórias que nos formam, reunindo textos de autores como Dulce Maria Cardoso, Gregório Duvivier, Rui Cardoso Martins ou Rui Tavares.
No prefácio, reservado a Alberto Manguel, o autor e bibliófilo expressa a possível contaminação literária que ocorre quando alguém que admiramos nos sugere um livro: “Como num jogo de apanhada literária, podemos tornar-nos o alvo que, tocado pela escolha de um título, o passará ao leitor seguinte. E assim a Biblioteca Universal se mantém viva.” Como possíveis guardiões dessa biblioteca, convidamo-lo a descobrir alguns dos livros da vida de quatro escritores presentes nesta coletânea e a deixar-se contagiar pelas suas sugestões.
Pedro Mexia
Depois de já ter dedicado um ensaio aos livros que compõem a sua biblioteca, o poeta e cronista Pedro Mexia abraçou mais uma vez o desafio de falar sobre os livros que fazem de si o leitor e escritor que é hoje. Enquanto em Biblioteca menciona vários nomes da literatura antigos e contemporâneos, desde Aristóteles a Houellebecq, quando questionado acerca do livro que mais o marcou, a sua escolha recai sobre A Terra Desolada de T. S. Eliot, um dos colossos literários de 1922 — um ano especialmente prolífico para a literatura. Este longo poema sobre os horrores da Grande Guerra foi a obra que cimentou a reputação do autor reconhecido com o prémio Nobel de Literatura em 1948, e para Pedro Mexia, mais de 100 anos após a sua publicação, “ainda causa deleite e horror.”
Giovana Madalosso
Voz profundamente original da literatura brasileira contemporânea, a autora de Suíte Tóquio e Tudo Pode Ser Roubado, Giovana Madalosso, dedica o seu impulso para a escrita a outro autor da América do Sul: Roberto Bolaño. Depois de ler os seus livros de contos e romances menores, chegou por fim a Os Detetives Selvagens, o livro que a fez começar a escrever de forma prolífica. Sete anos depois deu-se a sua estreia literária, que atribuiria para sempre a esta descoberta. Considerada a obra-prima de Bolaño, este romance em três partes sobre “dois jovens poetas em busca de uma poeta velha, pobre, ignorada e esquecida” (premissa que conquistou desde logo a escritora), foi eleito, em 2006, o livro chileno mais importante dos últimos vinte e cinco anos.
Valério Romão
Valério Romão, que acaba de publicar o seu primeiro livro de poesia (Mais Uma Desilusão), aponta uma das grandes obras literárias russas como a mais marcante na sua vida e trajetória literária. Era apenas um jovem universitário quando leu A Morte de Ivan Ilitch, de Tólstoi, pela primeira vez, mas este livro, tão breve quanto profundo, ficou consigo para sempre. Publicado em 1886, narra o confronto do protagonista com a proximidade da morte, enquanto revê a sua história e os momentos que definiram a sua existência. Texto incontornável sobre a mortalidade humana e o sentido da vida é para Valério Romão, “o grande teatro da vida”, com Ivan Ilitch como “o único portador de uma desarmante autenticidade corrompida. O único permanentemente nu, permanentemente belo.”
Tati Bernardi
Conhecida pela sua escrita humorística nos livros de crónicas Depois a Louca Sou Eu e Você nunca mais Vai Ficar Sozinha, Tati Bernardi surpreende ao eleger como autores favoritos Annie Ernaux e Édouard Louis. Em vez de escolher apenas um livro que mais a marcou, menciona um rol de obras que foram importantes para si em diferentes etapas da sua vida — entre elas, duas dos seus autores favoritos. De Ernaux, Um Lugar ao Sol, uma “obra em que a autora inventa e inaugura uma nova forma de escrever para narrar a vida e a morte do pai”. De Louis, Para Acabar de Vez com Eddy Bellegueule, a história de uma criança diferente e da sua vontade de se libertar da família que não o compreende. Os dois, reflexo de uma solidão interior que só conseguiram exorcizar por meio da escrita, e com a qual Bernardi também se identifica.
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