Mulheres portuguesas que se fazem escutar através da sua escrita
Por: Mariana Matos a 2023-03-08
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Hoje o dia destina-se a todas as mulheres.
A mulher é um elemento muito forte e presente na Literatura, contudo a sua afirmação e creditação enquanto autora não foi uma simples corrida de 100 metros, mas sim uma maratona.
No Dia Internacional da Mulher, decidimos destacar algumas das que, em Portugal, se fazem escutar através da sua escrita. Mediante esta seleção memoramos o nome de cinco escritoras que, com as suas obras, conseguiram elevar a sua voz.
Lídia Jorge
“(…) Hoje em dia, o reconhecimento da dignidade das mulheres passa essencialmente por elas mesmas, e mistura-se com o reconhecimento de outras categorias.” (Lídia Jorge em entrevista ao Expresso, em 2009)
Portadora de uma voz singular e reconhecida da literatura portuguesa, Lídia Jorge foi premiada em 2022 pela associação feminista espanhola O Clube das 25. O seu gosto pelo ser humano contemporâneo e pelo escrutínio de todos os seus aspetos são alguns dos pontos a salientar nas suas obras.
Das palavras a autora é capaz de conceber mundos inteiros. Dos seus pequenos lugares imaginários, que remetem para os tempos em que juntava páginas de agulha e linha na mão, passou a construir enormes mundos que já foram traduzidos em mais de vinte línguas.
É através da escrita que partilha o que tem de si para dar ao outro. Escreve sem ter em vista o fim desta sua paixão e sente-se imensamente feliz quando termina uma obra, apesar de precisar sempre de um novo romance. Entre os livros mais emblemáticos desta autora podemos destacar: O Dia dos Prodígios e Os Memoráveis.
Maria Velho da Costa
“Se uma mulher sozinha faz este barulho todo, imagine-se o que farão três” (Maria Velho da Costa)
“Nunca quis ser coisa nenhuma” confessa Maria Velho da Costa, que nunca teve em mente que a literatura se tornasse o seu ofício. Contudo, a linguagem, a palavra dita ou descrita, exerceu o seu poder sobre a autora de Maina Mendes (1969), o segundo livro que a consagra e com o qual se identifica mais.
A sua aprendizagem para ser escritora começou nas redações que aos 6 anos compunha e lia às suas colegas, no colégio de freiras onde estudava. Das redações seguiram-se cartas e outros textos, até que certo dia sentiu a vontade de escrever como forma de refletir, sobre si própria e sobre o mundo à sua volta.
Proveniente da pequena burguesia, consomou uma consciência política que desafiava o antigo regime vigente em Portugal, bem como uma oposição clara aos valores femininos tradicionais.
Maria Teresa Horta
“(…) Nunca deixei de fazer nada por medo. Mesmo que tivesse medo, ia além dele. Porque aí deixava de ter respeito por mim, e as mulheres não podiam deixar de ter respeito por elas. (…)” (Maria Teresa Horta em entrevista à Time Out, em 2022)
Militante da causa feminina, com uma avó sufragista, escritora e poetisa, Maria Teresa Horta foi perseguida pela PIDE e viu os seus livros censurados. A obra Novas Cartas Portuguesas, escrita a três mãos pelas feministas Maria Teresa Horta, Maria Velho da Costa e Maria Isabel Barreno, conhecidas pelas Três Marias, instigou a opinião pública contra o Estado Novo.
Maria Teresa Horta escreveu num tempo em que a liberdade faltava, mas esse foi um risco que decidiu correr, sem medo. Nunca desistiu, nem quando três homens a agrediram devido à sua poesia erótica. Pelo contrário, escreveu mais e com mais vontade.
Agustina Bessa-Luís
“Lembro-me de o meu irmão dizer, quando comecei a escrever, que se estivesse na América seria rapidamente célebre. E eu dizia que felizmente isso não acontece. Porque é muito importante a dificuldade. É preciso sentir que não é fácil escrever”. (Agustina Bessa-Luís em entrevista ao Público, em 2004)
Proativa e muito segura de si, Agustina Bessa-Luís nasceu no seio de uma família conservadora do norte de Portugal. Receava que se aproximassem dela por interesse e, por isso, decidiu tomar uma postura que representava bem o seu espírito autónomo e irreverente: publicou um anúncio no jornal que expressava a sua intenção de encontrar marido.
A autora, portadora de uma personalidade suis generis, trilhou um caminho admirável na literatura nacional, tendo, para além da escrita, feito parte da direção do jornal O Primeiro de Janeiro, do Teatro Nacional D. Maria II e da Alta Autoridade para a Comunicação Social.
Tenaz e sem “papas na língua”, a escritora viu-se envolvida em arrufos com alguns colegas seus, como Miguel Torga e Jaime Brasil, um crítico que fez uma avaliação negativa da sua obra Os Super-Homens.
Sophia de Mello Breyner Andresen
“Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo”.
(“25 de Abril”, in O Nome das Coisas).
Dona de uma escrita genuína que faz o leitor viajar, foi a primeira mulher portuguesa a receber o mais importante galardão literário da língua portuguesa: o Prémio Camões, no ano de 1999. Distinguiu-se pela sua atitude interventiva, aspeto que também se espelhou na sua própria obra, ainda que de forma mais subtil.
Sophia foi uma voz ativa contra o regime do Estado Novo e a sua luta antifascista torna-se bem notória na sua obra Livro Sexto, publicado em 1962. Além de ter sido uma das dezanove deputadas eleitas pelo Partido Socialista (PS) à Assembleia Constituinte, na sequência das eleições realizadas a 25 de abril de 1975, foi a única mulher a presidir uma Comissão — a Comissão para a Redação do Preâmbulo da Constituição — cujo texto se mantém inalterado desde 1976.
A frase “A Poesia está na rua”, acompanhada pelas pinturas Maria Helena Vieira da Silva, é da sua autoria, sendo um marco importante da iconografia associada à Revolução dos Cravos.