Sobre o livro
Trata-se pois, de uma narrativa cujo fio condutor se baseia na busca das motivações do ambíguo quotidiano e na simbiose equívoca dos enganados conscientes e inconscientes que existem em nós, nos nossos actos lúcidos e na nossa memória aberrante, que é como «aquelas testemunhas interrogadas pela polícia que já não sabem se reconhecem a fotografia porque já viram essa cara ou se reconhecem essa cara por já a terem visto nas fotografias mostradas pela polícia». E esses enganos constantes - de uns para os outros e de si para si mesmo, numa trama que se complica ainda mais com as traições da memória - constituem precisamente a essência e o fio condutor da vida.
O ambíguo tornou-se assim o fio essencial da existência real e fantástica: a crónica diária vai-se desdobrando com os tons do folhetim, de que esperamos todos os dias um novo capítulo.
«Na desconexa e conflituosa multiplicidade da vida, o indivíduo apercebe-se de que é apenas uma precária e provisória cristalização desses conflitos e descobre que já não lhe é possível desejar não ter mais nada sobre que se possa debruçar com amor e nostalgia» (C. Magris, Ítaca e Oltre, Milão, 1882, p. 6).
Diário de Notícias