Contos de Macau
de João Morgado
Sobre o livro
«Luiz fica perdido nas águas. De um lado as escritas de uma vida, dentro de um baú. No outro a mulher que lhe estendeu a ponta da sua blusa de algodão, a sua pele, o seu calor. E as águas selvagens a enrolar e a desenrolar os corpos, as madeiras, o cordame, as velas, os tonéis, o baú onde seguiam as odes aos reis que um dia tinham dilatado a fé e o império até Macau. E um braço no ar, um grito a dizer salva-me!. Não era isso que ela dizia. Gritava algo que não se entendia. Mas o poeta sabia que aquela boca cheirava a flor de cerejeira e o seu grito era uma súplica. E ia ao fundo das águas, pensando que se afogava, e vinha ao cimo para respirar… e ao longe o baú onde seguiam os versos épicos sobre um povo e os seus mais nobres, o trabalho de anos. E o grito de Tin Nam Men tão diferentes de todos os outros - tão nítido nos seus ouvidos, a estremecer-lhe a pele fria. E do outro lado, a perder-se nas vagas, o poema com a trama de homens e deuses, de tragédias e glórias, de passados e futuros. Perdoa! - soluçou ele a despedir-se de uns olhos arroz agulha que o olhavam de longe, chorosos.»
Álvaro Beijinha, presidente da Câmara Municipal de Santiago do Cacém