As Ervas do Tempo
de Paulo Bicho Garcia
Grátis
Sobre o livro
"Séculos passados, as cinzas do casebre deram lugar a um baldio de erva alta
(…)Em volta das estacas da cerca que o limita, renasceram, entretanto, centenas de pés de uma desconhecida variedade de erva-cidreira
(…)Manuel Martínez voltou a si, todo suado, aflito e confuso. Não fora um sonho comum; o seu realismo havia ultrapassado tudo o que já experimentara. Sentado à mesa da sala, ainda segurando a asa da xícara de chá, raciocinou, após sentir-se física e mentalmente recomposto: teria sido aquilo uma visão(?); uma composição aleatória do cérebro(?); uma memória?
Ninguém respondeu quando tocou à campainha da porta de Ignacio, quando bateu, quando chamou em voz alta. Nas casas vizinhas, ao contrário, várias figuras atentas assomaram, com discreta prudência, às suas janelas e sacadas, vestidas de cortinas, cortinados ou reposteiros. Virgílio, não ficando ainda apreensivo, como estavam os familiares mais próximos, não deixou de experimentar certa estranheza pela falta de resposta do tio.
(…)No ecrã, o seu tio aparecia sentado no preciso sofá em que agora estava, com os olhos e a boca abertos e com o tronco e o pescoço esticados (…) Virgílio, ainda atordoado com o que acabara de ver, repôs o filme, o aparelho e o respectivo comando tal como os encontrara, ficando depois a pensar no que fazer. Afinal, mesmo sem ter visto qualquer sinal de violência, parecia-lhe óbvio que alguém - Manuel, por certo - havia posto o tio naquele estado; que ele não passaria por aquilo de forma voluntária. Aos poucos, a imagem do cadáver de Ignacio enterrado algures lá fora, no jardim, foi ganhando espaço na sua mente até a dominar por completo.(…)"