Pins, Piercings & Jeans
de Diogo Cabrita
Grátis
Sobre o livro
Nos jornais de hoje, a tradição já não é o que era. Outrora, cabia aos jornalistas indavagar, registavar e escrever notícias, enquanto aos opinadores incumia reflectir, analisar, filosofar. Cada qual com os seus mister e território de intervenção definidos. As informações davam-nas quem as apurava, investigava e confirmava, ao passo que o seu enquadramento e análise crítica e prospectiva ficavam para quem opinava.
Nada disso sucede, hoje. Os jornalistas, cada vez mais avençados de estratégias empresariais complexas, têm mais coisas com que se preocuparem, para além das notícias. Por isso, tantas são as que nunca são escritas, sequer sabidas, muito menos investigadas.
Mais, os jornais de hoje não as comportam, enquanto tal, abafadas que andam no desenrolar sonolento de meros sucedimentos, a maior parte dos quias preparados à exaustão por assessores e gabinetes de comunicação. Pior, os jornais de hoje espartilham o espaço natural das notícias, empurram-no para lá das páginas nobres de entrada, onde cabem apenas as crónicas e as teses, próprias ou alheias, cada vez mais entrelaçadas e indiferenciáveis. Ora, é mesmo este o território dos textos de Diogo Cabrita.
Mesmo que os jornais onde escreve(u) não tenham ainda burilado aquela tendência crescente. Mesmo que os jornais que lhe acodem e propagam o talento não tenham, ainda, descoberto a infinita superioridade da crónica — substantiva, informada, narrativa, enfim, saltitante de vida —, sobre os taciturnos e não raro deveras previsíveis exercícios de redundância sociopolítica.
Olhemos, então, os registos linguarejados do cronista.
Apreciemos-lhe o período curto. A pontuação vadia. O vocabulário escorrido e radicalmente depurado do acessório, acentuação incluída. O título breve e sugestivo. O desenho gráfico contido, arrumado mesmo, em que a cercadura se abre ao rectângulo da imprevisível retratação do autor. Enfim, uma verdadeira impressão digital de oito anos de escritos regulares, em diferentes e inesperados periódicos, da Guarda à Figueira da Foz, começando naturalmente por Coimbra.
Dos jornais, de tanto espremidos, lidos e relidos, retenho escritos em forma de crónica que seduzem pelo bailado das palavras, pela elegância da sintaxe. Outros, porém, limitam-se a apedrejar-nos com ideias de força.
Os textos de Diogo Cabrita não são assim padronizáveis. Ele é, antes, uma espécie rara de cronista de jornal que apedreja com a força das ideias e, sobretudo, das convicções. Ele sabe que escreve para ser lido. Lido por quem lê, ali ao lado, notícias e outras prosas, por quem quer ajuda para compreender o mundo.
Sarcástico, aqui e ali, desesperantemente perfeccionista, radicalmente elitista. Conta histórias da vida real, que surpreendem de cruas. Arrisca incursões sociológicas aos pardieiros da portugalidade. Assume ódios de estimação oleados a fel. Reparte elegias contidas com mitos desprezados.
Afinal Diogo Cabrita faz da crónica de jornal o braço armado da vida. Uns quantos ousam, por vezes, fazer-lhe frente.
Irresponsáveis, por certo.
Paulo Marques
Jornalista