Os Poemas da Minha Vida
de Mário Assis Ferreira
Sobre o livro
Lia poesia ao sabor dos estados de alma: noctívago de nascença, era a lua a aconselhar-me entre o lúdico prazer de uma leitura descomprometida e o intrincado desafio a uma reflexão mais profunda.E assim nasceu esta colectânea sobre os «Poemas
da minha Vida». Ela reflecte, no seu universo, o gradualismo da minha aprendizagem na poesia, a cronologia do meu amadurecimento sensitivo, a transversalidade de múltiplos estilos e complexidades narrativas que, indelevelmente, me marcaram. Os poetas que escolhi, os cinquenta poemas que seleccionei, os comentários que sobre cada um deles escrevi, plasmam, de algum modo,
retratos de sentimentos que me afloraram na vida: cantam-me a nostalgia da portugalidade, mas recordam a parcela de mim próprio que deixei em oito anos de Brasil.
Mário Assis Ferreira
Numa nota introdutória sem título o próprio poeta em prosa Mário Assis Ferreira, usando da sua habitual elegância, não deixa de referir
que a poesia se lê «ao sabor dos estados de alma». Aproveito a afirmação - estamos de acordo, cientes de que os diferentes estados
de alma alteram a semântica do poema. Em práticas intertextuais implícitas e explícitas dá então conta da sua oficina de aprendizagem
para se diplomar em amante da poesia - diploma reconhecido -, um amante cauto pois cônscio de que o leitor, enquanto produtor de um
novo texto, não pode nem deve adivinhar a intenção do poeta. Os receios que atrás enunciei surgem assim acautelados pelo autor desta
recolha antológica. Estamos em sintonia.
Os 50 poemas seleccionados por Mário Assis Ferreira - acredito que resultantes de hesitações várias, contradições extemporâneas,
avanços e recuos e de um hard labor - são, no fundo, um retrato fiel do seu percurso vital e emocional. Ao tornar seus estes poemas é
porque neles vive a sua enciclopédia cultural e emocional que os antecipa sem os verbalizar.
Quero crer que uma leitura atenta do aparato paratextual adjacente a cada poema configura, antes de mais, uma escrita do eu, tornando
esta recolha o espelho do seu autor. Não me vou referir à selecção de textos apresentada. São autênticos poemas, sem excepção, que
ultrapassam a dimensão da poesia, seguindo a concepção de Schlegel. Tão pouco neles vislumbro a distinção feita dos seus autores:
poetas novos, consagrados, académicos, históricos, fadistas-poetas ou musicólogos. Não. São poetas que, vivendo tempos e circunstâncias
diferentes, alcançaram a bênção do artefacto do poema. São poetas diferentes, é certo, mas as opções de Mário Assis Ferreira têm o
virtuosismo do nivelamento - não dos poetas, outrossim dos poemas.
Isabel Ponce de Leão